terça-feira, 8 de novembro de 2011

ABAIXO-ASSINADO PELA ORQUESTRA

pub. dia 05/11/2008 por Wellington Bujokaswbujokas@gmail.com

A música erudita no Brasil sofre, freqüentemente, com sérios problemas institucionais. Ainda que possua um número bastante razoável de orquestra, por exemplo, boa parte delas vive não apenas uma penúria financeira, como, e principalmente, uma falta de rumo preocupante. Na maior parte dos casos, não vão além de cópias mal resolvidas do modelo de orquestra européia, cuja importância reside em reproduzir, a medida do possível, um repertório padrão, europeu, de perfil conservador não apenas em sentido estético, já que nem mesmo a produção atual que se apega mais fortemente à tradição tem espaço garantido na programação.

Ou seja, são museus do cânone, do sacralizado, mas com a deficiência um tanto assustadora, mas óbvia, de não poder competir com a qualidade das inúmeras gravações disponíveis no mercado justamente pela falta de foco neste projeto de se fazer um museu musical, associada a um orçamento baixo, freqüentemente instável e dependente de conjunturas políticas.

Ainda assim e apesar dos baixos orçamentos, as orquestras significam um gasto razoável, pelo número de músicos contratados, além dos funcionários da parte administrativa, técnica etc. e cumprem tanto uma função social — pois permite que as pessoas interessadas não se tranquem em suas casas para apreciarem música, mas saiam e interajam em sociedade — quando cultural, artística, humanística, ao disponibilizar arte à população.

As opções que se abrem são duas:

1. acabar de vez com esses órgãos sem direção a servir arte meia-boca, que, provavelmente, não mereçam sobreviver desta forma burocratizada, e mal burocratizada, já que as orquestras acabam tendo programações não apenas de baixa qualidade ou mal interpretadas, como também quantitativamente restritas, pela falta de dinheiro para uma programação constante;

2. fazê-las funcionais e eficientes.

A primeira opção é muito mais prática e com resultados claros: deixa-se de gastar dinheiro com políticas culturais de baixa qualidade; mas é também a mais cômoda e imediatista e significa, no fim das contas, só remanejar dinheiro de uma área ineficiente para outra — a menos que haja uma pressão em outras áreas por gastos mais bem planejados —, restringindo ainda as opções dos interessados por música e criando um vício em que a melhor forma de resolver um problema seria simplesmente apagar a estrutura que o causa, em vez de corrigi-la. A outra é bem mais trabalhosa e muito menos óbvia. Acima de tudo, exige uma participação ativa e constante da população (seja indo aos concertos, seja participando de discussões de como adequá-las ao interesse da sociedade) e um certo equilíbrio entre conservadorismo e inovação, para que concertos tragam e incentivem novidades (ou seja, novas obras, novas abordagens e formas de relacionamento com o público, para evitar a burocratização) ao mesmo tempo que sustentem o interesse pela tradição, preservando o que há de interessante na história da arte e evitando a espetacularização oca que, não raro, é efeito colateral da busca pela originalidade.

Com esse contexto em mente é que gostaria de pedir que assinassem o seguinte abaixo-assinado:

Ele se refere à Orquestra Sinfônica do Paraná, que se encaixa razoavelmente bem na descrição dada acima.

É uma boa orquestra, contudo, e poderia fazer muito mais se tivesse uma estrutura mais adequada e, claro, uma pressão razoável do público. A demanda básica é por duas melhorias:
1. uma temporada anual fechada com antecedência, ao contrário do que acontece hoje, em que chegamos a ter concertos que são anunciados com uma ou duas semanas de antecedência. O motivo principal é tanto permitir que as pessoas possam se programar melhora para assistir aos concertos que as interessam, como evitar que diversos concertos programados, mas não divulgados, sejam cancelados ou completamente alterados por falta de verba (ou seja, por falta de um planejamento adequado).

2. uma gestão eficiente, que otimize gastos e facilite os patrocínios privados, para realizar concertos, equipar a orquestra e o teatro decentemente (veja-se, por exemplo, que o Teatro Guairá não tem concha acústica e isso seria básico para que o público pudesse ouvir decentemente a orquestra) e permitir convidar solistas interessantes (que, em geral, não tocam com a orquestra porque o cachê é muito baixo), bem como pagar os direitos autorais e comprar/alugar o material para tocar peças contemporâneas brasileiras e estrangeiras (acredite ou não, este é um dos motivos mais importantes para elas não serem tocadas)


Enfim, há ainda uma série de reivindicações que precisam ser feitas, como gravações de cds e apresentações semanas na rádio e na tv públicas (visto que o dinheiro para bancar a orquestra vem dos contribuintes de todo o Estado, mas a orquestra não consegue se apresentar mais do que uma ou duas vezes ao ano à população do interior, é importante que eles tenham produtos palpáveis pelo que pagam), um número maior de apresentações de um programa (chega a ser meio absurdo que a orquestra só se apresente num horário nem sempre muito prático de domingo de manhã enquanto sextas e sábados ficam vazios) e, principalmente, uma concepção artística mais lúcida. São, contudo, reivindicações que esperamos serem mais fáceis de atingir uma vez alcançadas as duas demandas básicas.
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