quinta-feira, 27 de outubro de 2011

TRASH É COMER MULHER MENSTRUADA, ZÉ DO CAIXÃO É SUPER CULT

pub. dia17/10/2008 por Leandro Hammerschmidt

Super Cult nos EUA e agora aqui no Brasil!

Também pudera. O personagem de José Mojica Marins mora naquele mesmo lugar de um Drácula, um Karloff, um Lugosi e um Saci. Se você ainda não percebe isto é porque ele esta vivo, e que assim permaneça por mais algumas dezenas de anos. O cineasta é homem do povo, do povo brasileiro, seu personagem Zé do Caixão é patrimônio da nossa cultura. Bem, na verdade, é universal nosso Coffin Joe.

Mojica é carismático e até bem bizarro (não por aquilo que fez e faz no cinema), mas sim pela trajetória como cineasta/personagem que foi de coveiro cruel e sádico a candidato a vereador; de cineasta marginal/preso duas vezes a convidado de honra em festividades; de marca de cachaça a modelo de carro. O público adora Mojica, mas não é difícil encontrar entre seus fãs aqueles que nunca assistiram a um filme seu. Vai entender! Pra descobrir um pouquinho mais, a equipe do jornal TiraGosto foi atrás dele nestes dias em que esteve aqui em Curitiba para o 3º Festival do Paraná de Cinema Brasileiro e Latino.


Antes de tudo quero fazer algumas considerações sobre o criador e a criatura:

1) O cineasta José Mojica Mojica se mistura ao personagem Zé do Caixão, uma coisa que vai “além muito além do além”. Mas num episódio a Revista Realidade publicou uma reportagem insinuando que ele dependia do Zé do Caixão, depois disso o cineasta fez sete filmes sem usar o personagem. Só de pirraça.

2) Mojica foi pioneiro em muitas coisas aqui no Brasil do terror a zoofilia – no filme “24 horas de sexo ardente” coloca o pastor alemão Jack pra fazer amor com uma mulher, inclusive amor anal

foi seco!
continuando as considerações:

3) Mojica já foi acusado de misoginia (repulsa mórbida do homem pelas relações sexuais; horror às mulheres) por causa dos horrores que causa as fêmeas nos filmes: ratos, baratas, cobras e aranhas; e até cena de estupro. Inclusive no último filme “Encarnação do Demônio” tem uma cena de terror “que americano nenhum teria coragem de fazer”. Por isso sinto muito pelas lindas caixonetes!

4) Zé do Caixão não faz só filme, faz além disso: faz cinema. É artista sensível ao público. Primitivo como explica Glauber, autêntico, seguidor da sua intuição e aqui reside a sua força. Aliás, Mojica é a unanimidade entre Sganzerla e Glauber. E eu de inocente, puro e besta pensava errando sobre o que era ser primitivo. Achei que ele tinha sido romantizado e nem me dava conta (antes de conhecê-lo) da preciosa técnica - mesmo que não muito didática -, atrelada ao sentimento, condições e mística do Mojica.


O homem da cartola e capa preta ganha força no modo como fala, na sua teatralidade, nas famosas unhas. O cara é um saci, “uma lenda-viva”, coisa que ele mesmo faz questão de anunciar. Aliás, Mojica sabe vender seu peixe. É bom principalmente na escolha dos títulos (tem tudo de Sampa, cordel e NP): “Sexo e Sangue na Trilha do Tesouro”, “D’gajão Mata para vingar (feito aqui no Paraná)”, “Beijos a Granel”, “Ritual dos Sádicos (O Despertar da Besta)”. Sem me esquecer dos títulos mais românticos “À meia-noite levarei sua Alma” e “Esta Noite Encarnarei no teu Cadáver” - os dois primeiros da trilogia que se completa em “Encarnação do Demônio”.

FICHA DA CRIATURA, ZÉ DO CAIXÃO

Seu nome é Josefel Zanatas, agente funerário, filho de pais ricos, mas que foi rejeitado por outras crianças justamente pelo ramo da família. Lá pelas tantas perde os pais. Na época que ele já está acertado com uma mulher. Depois do acidente de avião (que morrem os pais dele e os pais dela) Josefel resolve se alistar no exército pra lutar na 2º guerra mundial. Dos campos de batalha – na Itália – envia cartas que jamais chegam a sua garota (teve problemas de correspondência assim como Drácula). E por causa deste desentendido quando regressa herói de guerra encontra sua amada no colo do prefeito. O que ele faz? O que você faria? Josefel dá um balaço na boca do político e mata a infiel também. Não é preso por ser herói. Mas se revolta e sai por aí desiludido.

Nesta época só as crianças gostam dele. Josefel só veste roupa preta, barba e cartola. Ganha poderes: “o poder de assustar os outros”. No seu julgo aqueles que se assustam com ele são inferiores. Logo, podem morrer. Dali pra frente Josefez sai em busca de pessoas (+ mulheres) que pensam como ele, ou seja, pessoas frias que não sentem amor nem ódio. Nas palavras de Mojica, o Zé do Caixão quer “justiça”. Esta parte da justiça ficou meio sem nexo pra mim, mas tudo bem. Salvar a humanidade é o argumento, espalhando uma raça superior na face da terra. Basicamente é isso.

ENTREVISTA

Que felicidade! Conseguimos uma entrevista exclusiva com o Mojica no domingo (12). Peguei o bicho chegando da feirinha do largo da ordem. Ele me falou de uma feira maior lá em São Paulo. Convencido! Ele estava muito bem acompanhado por Jannete Tomiita, Paulo Sacramente, o produtor, e por sua filha LizVamp. Filei dele um cigarrinho mentolado e ficamos ali na frente esperando meu camarada Igor Kalashnikov chegar com a câmera pra gravar a entrevista. De três em três carros que passavam um dava uma sinal pra Mojica.

Não conseguimos as imagens, mas pude matar minhas curiosidades:

Você pertence à Ordem do Dragão? Não, mas foi convidado. Conheceu o Lugosi? Não, mas ganhou um anel da filha do Boris Karloff. Já foi preso duas vezes né!? Sim, foi preso e perseguido por muitos anos, ameaçaram queimar todos os seus filmes. Sua formação religiosa? Católico até o dia que um padre deu chilique. Bebe Coca? Não, porque, assim com eu, ele sabe que cafeína é broxante para o homem e esterilizante para a fêmea. Quem morreu? O primeiro foi Nuvem Branca, excelente foquista, que morreu de tanto beber. E as mulheres? Zé é casado com uma de 25 anos. Falou ainda sobre o bebê diabo. Estendeu sobre o jornal Notícias Populares. Sobre a tal feira de lá. Sobre a vaca mecânica de 300 mil reais que faliu num sei quem. E mais sobre um monte de coisas destes 50 anos de carreira. Até que Paulo Sacramento, o produtor do filme, chega (junto com Igor) avisando que a “van do almoço” sai em três minutos. Valeu mesmo!

Pelo que o amigo leitor pode perceber: não levo jeito pra entrevistas, muito menos na área cultural - que interessa muito mais o pensamento que a vida do artista. Mas pra que separar Zé e Mojica? Não pensei nada pra assumir papel de fã já no hall do hotel. Disse assim pra ele “no começo você parecia um gato preto com aquela barba preta, aquele cara de lunático”. Entregamos até um livro sobre a história do NP, jornal que lhe ajudou e que ele ajudou muito também – principalmente na hora de dar fim ao Bebê Diabo depois das 21 capas seguidas, mandando o cramulhãozinho lá pra Qui-Bebe, na Bahia, e depois pro exterior. Bom na Bahia eu já sabia, mas o lance do exterior ficou no ar.

O COMEÇO DA TRILOGIA

Não quero entregar, mas uma cena belíssima de “A meia noite levarei tua alma” (primeiro da trilogia) é quando Josefel mata seu pobre amigo na banheira. Aquilo sim é terror, ele acomodando o cabra e abrindo a torneira.

Mais cenas do Mojica? A beleza de “aranhas vindo por baixo da porta”. O Inferno frio e colorido num filme P&B. O estupro “divino, maravilho” internacional. Uma cena do segundo filme da trilogia “Esta Noite” é a felicidade de Laura rodando em seus braços. Triste destino.

“Padre me dê este crucifixo, quero crucificá-lo de novo” - A igreja sofre nos filmes do Mojica. Eles vão desmistificando. Sabia que Mojica tem formação católica? Nada mais terrível que o catolicismo né!?
Quem é o inimigo? - Neste mundo politicamente correto, muito sutil, que estuprador se lasca, onde o Zé do Caixão poderia morar em paz? Cadeia! Sim. 40 anos. 10 a mais que o João Acácio da luz vermelha. Pela lei acho que nem pode ficar mais de 30, mas ouvi dizer que existe um cara preso há 39 anos no Brasil. Que seja! Zé do Caixão mata um pra cada ano e quando sai, quem ele mata? Uma dica: Zé do Caixão tem tanto carisma que não poderia ser só um simples assassino. Zé do Caixão é justiceiro. Um lampião.

Perguntei pro Mojica quem o Zé do Caixão mata? “Todos que cruzam seu caminho” [até chegar ao filho perfeito]. Simbolicamente ele mata político, polícia, padre, poder, gente que maltrata crianças e – como ele não é de ferro – algumas mulheres à toa e, numa situação limite, lindas velhas ciganas inclusive. Na cena mais bonita e depois sangrenta da terceira parte da trilogia.

Também perguntei o que mudou no terror nestes 42 anos? O que você acha leitor que mudou? Será que é sempre a mesma coisa que assusta? Alguém se assusta ainda? Mojica usa mais de três mil baratas “em cada cena morria 100” e o resto é surpresa. Assista “Encarnação do Demônio”. Mas saiba que no fundo Mojica é um romântico que faz filmes de terror pra juntar pessoas – o casal fica assustadinho, se agarra e pimba!

Encarnação do Demônio - Mojica queria arrebentar os limites, mas reconhece que mesmo com toda esta liberdade e produção nem conseguiu chegar lá - aonde sua imaginação vai.

O roteiro pra “Encarnação do Demônio” existe desde 1966 se não me engano. Um azar desgraçado impediu a realização desse filme. Primeiro parece que morreu o primeiro produtor, a viúva nem sabia de nada, nada ficou escrito, faltou grana: parou o filme. Desta vez foi tudo jóia. Só morreu o Jece Valadão, faz parte do show, mas o filme saiu e junto com Batman.

O roteiro já existia desde de 1966, como disse. Mas desde “Esta noite encarnarei no teu cadáver” muitas coisas mudaram. As crenças, o terror, a religião, o Brasil, enfim, tudo. As coisas mudaram. Menos uma coisa, o “o sangue (ainda) é a razão da existência”. Então, lá foi Josefel mais uma vez atrás daquela mulher que pudesse lhe dar o filho perfeito (filho né! porque filha tanto o personagem quanto o Mojica já tem. E é a mesma, Liz Vamp, mas isso é outro papo). Josefel quer um filho macho, aquele que salvará a humanidade. Que vai dar início a uma raça superior, sem amor ou ódio, sem crenças e fraquezas. Totalmente demais.
Nessa busca aparece cada mulher meu amigo. E aqui está um segredo não muito escondido do nosso terror.


Não consigo me esquecer da beleza e simpatia da japonesa Jannete Tomiita, modelo, desenhista e atriz de 22 aninhos; que numa das cenas do “Encarnação” fica rezando costurada dentro de um porcão. Janete disse que sofreu pra fazer e que ficou com muita pena do bicho e contou que o porco foi comido depois. Penso que se estivéssemos no Japão, do jeito que ando lendo Suehiro Maruo e consumindo pornografia japonesa, talvez este animal valesse uma pequena fortuna por causa do inusitado. Era só questão de achar o decano correto.

Não perguntei ao Mojica como vão as caixonetes? Quantas e tão corajosas! Mas sei que muda a vida de uma garota cruzar o caminho de Josefel Zanatas. Cadê a Laura? E a Teresinha? Não tiro da minha cabeça a pobre choramingando “você me desgraçou Zé, vou me matar”.

Voltando ao “Encarnação” preciso dizer que o desenrolar do filme é interessante. Os caras tem o filme na mão. Com destaque para a macumba e para o Mistificador, aquele louuuuuuco do Zé Celso, que fica olhando as coisas pelo buraquinho do olho da caveira de abutre. Bom, já falei demais sobre o filme. Agora é com você. Vá ao cinema conferir “Encarnação do Demônio”. Prestigiar o cinema nacional. Senão você vai engordar até sua cabeça explodir - praga do homem!

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HOJE É DIA DE LONGAS CRÍTICAS EXPOSITIVAS

pub. dia 17/10/2008 por Cid Monteiro - Curtos ou Longos

Estava eu na recepção do consultório, aguardando minha vez, quando abro a Veja e leio um interessante texto do Millôr sobre automobilismo e os dias atuais. Me chamou a atenção a posição do autor acerca da tecnologia e o artificialismo que algumas coisas, como as corridas, passaram a ter atualmente em função de tanto avanço.

Na tevê, ele diz que o piloto limita-se a “um pedaço de capacete visto por trás, que pode ser de qualquer um”. Ao vivo, “apenas bólidos de brinquedo passando”, e que é uma tela que mostra, em “numerinhos eletrônicos”, quem está a frente.


Paciência. De fato, a modernidade tem nos tirado os grandes sabores da vida. Bandas, por exemplo, põem ruídos em suas faixas para reproduzirem o nostálgico característico som do vinil. Na lanchonete, não adianta pedir “capricha!” porque o andróide que está servindo cumpre ordens e todos os molhos e ingredientes seguem rígidas padronizações globais que não permitem que a quantidade da batata ou o peso do sanduíche possam ser alterados, e nem que a casquinha possa vir com uma volta a mais. E a indústria anda tão ética que, para não prejudicar o seu consumidor aumentando o preço de seus produtos, diminui o conteúdo das embalagens.

Faz tempo, na verdade, que queria escrever esse texto e compartilhar com você, companheiro leitor, um pouco das indagações cotidianas que vêm me afligindo. Fiz uma espécie de pesquisa (que resumiu-se a anotar fatos observados num velho caderninho durante alguns meses) na qual enumerei uma série de fatos atuais que me chocam ou, no mínimo, intrigam meu bom-senso, e fazem-me ver o quanto os valores mundanos estão completamente invertidos.

Já que falei de indústria, comecemos por uma água de côco curiosa que me foi dada como brinde numa dessas feiras e exposições de shopping. Ela vinha em caixinha (até aí ainda vai, pois vivemos no mundo dos sucos e das coisas em caixinha, já me acostumei), mas essa era filtrada e destilada! Não é fantástico? Impossível resistir e ficar sem tomá-la depois de ler isso. Na verdade, é o mínimo que se espera, hoje, de uma água de côco em caixinha e antenada com as últimas tendências. Fica mais divertido pensar na gama de opções existentes quando você oferece cerveja para um amigo e ele responde “não, obrigado, prefiro destilados”.

Mas digo que isso não é nada perto do que li agora, enquanto escrevia. Fui até o Deus Google e digitei “água de côco destilada” (procurando mais embasamento para o meu texto). O que encontrei? “CE desenvolve água-de-coco em pó”. Melhor que isso só quando dei de cara, há alguns anos, com a notícia do lançamento do ovo sem colesterol (e também em pó)! O pioneiro leite em pó já é banal.

Continuando, até onde lembro, o fio-dental, por exemplo, propunha-se a remover resíduos entre os dentes. E quando é ele que, depois de duas passadas, desfia e prende entre os dentes, incomodando mais do que o pedaço de carne que já estava lá? O que pensar da camisinha aprovada pelo Inmetro que, mesmo depois de submetida a rígidos testes de resistência e elasticidade, é colocada corretamente e rompe-se? Nada demais. Ela só serviria para evitar a gravidez e a transmissão de doenças sérias.

Acontece. Não dá para “levar tudo a ferro e fogo”. Tudo isso é possível (e comum já) num mundo onde universidades e instituições promovem cursos de Gestão de Pessoas (adoro esse termo: “gestão”! Simplesmente se enquadra em qualquer coisa que você queira, experimente!); onde você põe na MTV e, o dia todo, passa qualquer coisa menos música (o nome dela deveria ser ATV - Anything Television); onde a promoção da rádio consiste no ouvinte mandar para lá o horário em que ouviu a última da Britney Spears e quantas “cacarejadas” (é esse o termo usado) ela deu durante a música; onde a mesma rádio, em seu programa de tevê, sujeita mulheres esculturais de biquíni a comer pedaços cozidos de sola de sapato (usado) para ver qual delas tem mais disposição (e mais silicone no cérebro).

Melhor que isso é trocar de canal e ver o telejornal nacional dizendo que as bolsas de Nova Iorque estão na pior crise desde a quebra em 1929 (e com isso o dólar, ao invés de desvalorizar, fica mais caro - nunca vou entender), que o aumento da inflação anual do Real não cessa, que por aqui já estão importando água, e ver imagens de pessoas passando fome nas ruas e sertões d’um país tropical, de terras extremamente férteis e com tradição agrícola como o nosso. É preferível esperar terminar o bloco da economia e ver no próximo que São Paulo registrou engarrafamento recorde mais uma vez e que, no entanto, 800 novos carros entram em circulação em suas ruas diariamente.


Obs.: Falando em carros, capitalismo e compulsividade consumista, tem coisa mais avançada do que em meados do ano corrente você já poder comprar um carro do ano seguinte?

“Faz parte”, como já dizia um dos participantes do programa Big Brother Brasil (por que não escrevem logo Brasil com Z duma vez, se é pra usar estrangeirismos?). Nesse mesmo programa, que bate recordes de audiência todo ano e já se encaminha para a 9ª edição (creio sermos o país a ter ido mais longe com essa brincadeira), os fiéis telespectadores devem ligar para números de telefone iniciados por 0300 para votar em quem deve sair no “paredão”. Incrível! Pra que ganhar dinheiro só com a audiência, patrocínio e publicidade (dentre outros) se também dá para explorar os alienados que querem ligar e participar desse circo? Afinal, liga quem quer (lembre-se que até certa edição do programa todas as linhas para este fim eram 0800 - mas isso também era no tempo em que o interesse de que a pessoa assistisse o BBB, e participasse, era da emissora).

E se a tevê pode abusar, por que não, os bancos e outros números de suporte? É só observar quantos serviços ainda têm números de atendimento gratuitos à disposição do cliente. E pior, há ainda uma nova categoria nesta modalidade; quando não são os 0300 que substituem os 0800, surgem os 4004. Eles são os novos “dígitos mágicos” (porém não menos taxados). E o mais cômico de tudo é, sem dúvida, os tele-atendimentos que possuem duas opções diferenciadas: as iniciadas por 4004, para capitais e regiões metropolitanas, e por 0800 para o restante. Faz sentido! Quem pode dar-se o luxo de morar numa capital, ou próximo a ela, tem mais dinheiro e tem que pagar mais.

Justo. Mas nem só de absurdos é feito o mundo, e o país. Existem leis também para salvaguardar as pessoas e assegurar seus direitos. Por exemplo, eleitores (não disse todos, somente eleitores, ou seja, obrigatoriamente aqueles com 18 anos ou mais - ou quem já pode ser preso, como preferir) não podem ser detidos no período compreendido dos 5 dias que antecedem as eleições aos 2 que a seguem (salvo em flagrante delito, ou em virtude de sentença criminal condenatória por crime inafiançável ou por desrespeito a salvo-conduto. Ufa!). Quem foi esperto aproveitou essa semaninha de folga para exercer a cidadania e, livre, aplicar atos de democracia pelas ruas. Muito bem!

Semanas antes, na minha recente ida a europa, entrei numa daquelas grandes lojas de música, livros e filmes em Amsterdam. Procurei os cds do Pearl Jam, procurei, e não conseguia achar. Até que resolvi pedir ajuda a uma funcionária, que disse: “temos sim, mas não ficam aqui (na seção de rock), é n’outro andar, na seção ‘pop’”. E lá fui eu, desolado, e sem mais tesão de ver o preço. No caminho, uma surpresa boa: o filme Central do Brasil, e em promoção! Sempre bom ver o que é nosso cruzando fronteiras e barreiras. Mas, como dizem, “alegria de pobre dura pouco” e descobri que seu título internacional em inglês é Central Station - afinal Brasil é totalmente suprimível nesse caso. Diria até que é apenas um mero detalhe, um enfeite no título, que por acaso origina-se do nome próprio da estação verdadeira, onde se passa o filme, na cidade do Rio de Janeiro.


E falando em música e cinema, lembrei de shows (categoria na qual enquadram-se peças, danças, espetáculos musicais, etc) que, hoje em dia, têm a venda dos seus ingressos atrelada a uma curiosa prática. Dispondo de duas tarifas, inteira e meia, a venda desta última é feita geralmente para estudantes, maiores de 65 anos e para aqueles que levem 1kg de alimento no dia do evento. Vai dizer que não é no mínimo engraçado colocar tão distintos e amplos públicos na mesma categoria? E o mais cômico dessa história ainda está por vir: a tarifa integral é oferecida por um preço astronômico (e que ninguém paga!), e a “meia entrada” torna-se mais acessível a um preço mascarado e fantasioso. O que ninguém parece notar é que todos estão simplesmente pagando o preço da inteira, pois a “meia”, verdadeira, já deixou de existir há muito. E me pergunto se sobra ainda algum direito ao aposentado e ao estudante, que passam a ser tratados como qualquer assalariado (ou não) portando um saco de comida - que vai pra onde no fim das contas?

É chato admitir que o mundo moderno, aliás, mundo contemporâneo (se a Idade Moderna já findou-se, deve ser falado mundo contemporâneo, que é mais moderno), está perdendo a graça. Mas parece que não há como ver as coisas de outro jeito quando passo numa banca de jornal e dou de cara com a capa d’uma daquelas revistas femininas, com o título “Orgasmo: garanta já o seu”. Está à venda? Ninguém me avisou…


Certo mesmo estava Millôr, que terminou aquele seu artigo (ao qual me referi no começo) dizendo: “Hoje morar em Viracopos, debaixo da ponte aérea, é mais radical do que pilotar uma Ferrari.

E uma disputa de skate também é muito mais perigosa, portanto mais emocionante, do que qualquer Fórmula 1. Esteticamente, então, nem se fala. E skate você também vê com os próprios olhos, não precisa de eletrônica pra dizer quem foi o melhor.”

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FESTIVAL DE CINEMA DO PARANÁ


Respeitável público.
Luz, câmera, ação.

Tudo começou quarta-feira da semana passada. Soube, através de um grande amigo meu, da existência de um Festival de Cinema do Paraná. A grande mídia, curiosamente, não falou sobre o assunto. Fui informado também que esse festival estava sendo realizado no Museu Oscar Niemeyer. Ou seja, nas proximidades de meu Lar Doce Lar e ao lado do meu local de trabalho.

Sendo assim, corri em direção ao “Olho” e, logo de cara, pude rever dois adoráveis companheiros. Leandro Hammerschmidt e Igor Kalashnikov lá estavam, prontos para saborear o Festival. Após um bom tempo fora do Brasil, é sensacional rever figuras que fazem parte de nossas Vidas…

Logo em seguida, entramos numa sala onde estavam ocorrendo palestras, seminários e oficinas. Neste recinto, pude assistir, do início ao fim, um tal de “Terra em Transe”, de um tal de Glauber Rocha. Na faixa. Não paguei nada, e pude mergulhar num dos melhores filmes da história do cinema brasileiro. Surreal. Real. Absurdo. Vivo. Insano. Verdadeiro. Psicodélico.

Continuei pelas redondezas, admirando a beleza arquitetônica do local, e entrei no auditório “titular” para conferir uma mostra de curta-metragens. Filmes bons e ruins ao mesmo tempo. Destaque para o documentário “Solitário Anônimo”, de Débora Diniz. A diretora brasiliense soube conduzir com maestria a trajetória de um idoso sábio, andarilho e descontente com a vida, que resolve abandonar sua casa, morar nas ruas e deixa de se alimentar, entregando-se ao caminho da morte. Ele, porém, não consegue alcançar esse objetivo, pois acaba sendo internado num hospital e é alimentado “na marra”. Um filme que coloca em xeque a questão do livre arbítrio, se podemos ou não realizar as nossas escolhas.

Após acompanhar mais um solitário anônimo nesse mundo injusto em que vivemos, permaneci no auditório e acompanhei o filme argentino “As Mãos” (Las Manos), de Alejandro Doria. Película redonda, fotografia interessante, estética apurada. Peca, porém, no teor excessivamente religioso do enredo em questão, muito embora com ótimas interpretações do elenco em cena.

Sexta-feira chegou, e as celebridades também. Apesar de não ser um dia de número 13, José Mojica Marins lá estava. ZÉ DO CAIXÃO, em carne, osso e unhas nos brindou com sua simpática presença. O mito ainda vive, e veio à Curitiba para lançar a sua “Encarnação do Demônio”, completando uma trilogia idealizada há mais de quarenta anos. Particularmente, adorei o resultado final. Sangue, psicopatias, fortes mensagens e belas mulheres nuas foram servidos num delicioso prato. Viva Mojica!

Antecedendo o Zé do Caixão, o cinema paranaense foi destaque com a bela obra “Cortejo”, de Marcos Stankievicz e Joba Tridente. Sem conter diálogos, o filme mostra uma inovadora forma de linguagem, onde as cenas se desenrolam de forma poética. Contando com uma bela e sedutora protagonista, “Cortejo” possuem também uma inspirada trilha sonora. Tudo isso filmado, claro, em película.

Ainda na sexta-feira, chegou a vez de “Mystérios”, que ganhou o prêmio de melhor direção. Beto Carminatti e Pedro Merege, os diretores premiados, realizaram esse filme, baseado em textos de Valêncio Xavier. Inteiramente rodado em Curitiba, “Mystérios” traz Carlos Vereza na pele do impagável protagonista. Contando também com outros atores globais, esse filme transporta o espectador para uma Curitiba da década de 60, do Passeio Público, da chegada do homem em terrenos lunares. Os mistérios que envolvem as noites curitibanas e as mentes das pessoas são brilhantemente narrados por Vereza, que observa, com muita poesia, o charme e os segredos da bela Stephanie Brito, a eterna Lolita dos apaixonados de plantão…
Sábado em cartaz, e curta-metragens também. Antes de conferir os filmes do dia, houve mais reencontros memoráveis. Eduardo Nascimento Rohn e Eduardo Martins Amatuzzi (sim, xarás!) lá estavam. Após mais esse “momento máximo da consagração”, volto à sala de exibição, e deparo-me com sonolentas e interessantes obras, que se alternam com incrível maestria. Gostei de “Sete Vidas”, dos diretores Marcelo Spomberg e Zé Mucinho, de São Paulo. Muito feliz a escolha por Selton Mello para narrar o filme. Um gato (felino) é o carismático protagonista.

Domingo, então, marcou o encerramento do festival. Premiação aos vencedores e a exibição de mais alguns bons curtas, tais como “Os Dias Cinzas”, de Bruno de Oliveira e “Com as Próprias Mãos”, de Alysson Muritiba. Psicopatia, sangue e violência marcam ambos filmes, que exploram algumas mazelas humanas, tais como a sede de vingança e a mente doentia do homem/mulher “modernos”. “Satori Uso”, do diretor londrinense Rodrigo Grota, encerrou a noite como um belo exemplar do “cine-arte”, de um filme alternativo que prima pela beleza fotográfica.

Outros ótimos reencontros também marcaram esse domingo. Franco Caldas Fuchs, Emanuela Khalil, Rafael Dias e Ana Niculitcheff deram o ar de suas graças. Eu só esperava a presença de um maior número de alunos e ex-alunos de Comunicação da UFPR. Vou supor que todos estavam muito ocupados durante todos os dias do Festival. Tudo bem, espero ver vocês em outras ocasiões. E a cobertura da mídia local também deixou a desejar. Rivalidades entre governo do Estado e emissoras de televisão ficaram evidentes.

E, antes de ir embora do Niemeyer e do Festival, ainda houve tempo para um coquetel de despedida, onde o ator Selton Mello gentilmente me “colocou para dentro”, pois só “convidados” poderiam entrar no início do “comis-e-bebis”. Descolamos também o telefone da casa do ator Carlos Vereza, que gentilmente atendeu os repórteres do Jornal TiraGosto - Leandro Hammerschmidt e Jackson Sardá - e disponibilizou seu telefone residencial no Rio de Janeiro, visto que Vereza não possui e-mail nem computador, e não pretende ter um. Entendo perfeitamente ele. Rodrigo Juste Digão Duarte e Maurício Olinda Cio-ri-mau, o lendário motorista do filme “O Condutor”, também estavam presentes no Festival. É isso aí galera, vamos fortalecer cada vez mais o Cinema Paranaense!

Jackson Sardá.
13/10/2008.

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quarta-feira, 26 de outubro de 2011

JACKSON SARDÁ ESTÁ DE VOLTA

O cara passou não sei quanto tempo em Jerusalém, mas antes de ir pra lá fez o vídeo Transtornos. De volta à Curitiba, Jacks vem pra soltar os bichos:




As imagens são de Eduardo Rohn da eedstudios e Igor. Com elenco reduzido, poucas locações e sem muita frescura: a produção saiu em conta. Pra ser sincero trata-se de um vídeo caseiro mesmo: sem dinheiro, spot de luz nem nada. Pra fazer Transtornos bastou Jackson Sardá sentar no escorregador e trabalhar pra câmera seus vinte e poucos (quase 30) anos de neuroses.

Destaque para a participação especial de Mãozinha (aquele que vem com pílulas filosóficas) e para a edição do Eduardo.

pub. dia 09/10/2008 por Leandro H.
pra contextualizar: Jackson Sardá é jornalista, atleticano e onanista, mora em Curitiba e deve se tornar nosso colaborador

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VOCÊ... VOCÊ E TODOS VOCÊ

José Mojica Marins está chegando a Curitiba para dar uma oficina de Cinema Marginal no domingo (12). Ele mesmo, Zé do Caixão, o homem que deu jeito no Bebê Diabo do Notícias Populares está chegando aqui pro 3º Festival de Cinema do Paraná.




Sexta-feira (10), às 20hrs no Museu do Olho (Curitiba) será exibido Encarnação do Demônio, o mais novo filme do Mojica. E esta é só uma das várias atrações deste Festival (que rola de 6 a 12 de outubro/2008) e tem sido assim: de manhã curtas e debates; tarde retrospectiva Glauber Rocha e Dino Risi; noite curtas e filmes inéditos lá no Olho (e de graça). Confira a programação no site do Festival.

Quem não for nesta sessão sofrerá com alguma praga do homem.

(pub. dia 08/10/2008)

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um DIA DE CÃO PARA CLEMER

pub. dia 06/10/2008 por Humberto Ferreira Gomes - humbertofgomes@gmail.com


O jornal TiraGosto continua a série de reportagens sobre a cobertura da imprensa nos jogos de futebol. Desta vez fomos ao Couto Pereira, no alto da glória, para cobrir a partida Coritiba x Internacional de Porto Alegre. Jogo da 28ª rodada do campeonato Brasileiro.

Credenciamento: como manda o figurino, antes de tudo, é necessário fazer contato com a assessoria para que coloquem o nome do profissional que irá trabalhar na partida na lista. Diferente de quando fui cobrir o jogo, Atlético x Ipatinga, na arena da baixada, não recebi credencial e sim um ingresso para as cadeiras superiores, que é onde ficam as cabines de imprensa.

Ingresso na mão, hora de trabalhar. Peguei o elevador e fui reconhecer o local. É o mais indicado a fazer quando se vai a algum lugar pela primeira vez. Andei a procura de uma cabine vaga, mas resolvi ficar no cantinho do estádio, próximo à torcida dos visitantes. Como ainda faltavam alguns minutos para o jogo começar, aproveitei e comi um espetinho de frango.


A estrutura para a imprensa segue o mesmo padrão do relatado na matéria que fiz no Atlético. Cabines de rádio, TVs que não fazem ao vivo, TVs que fazem ao vivo, imprensa escrita e no centro a cabine das câmeras. A diferença é que no Couto Pereira é possível ter acesso às cadeiras, o que tem suas vantagens como proporcionar maior mobilidade ao jornalista.


Rola a bola no campo do Coritiba, o gramado encharcado, por conta da chuva que castigou Curitiba durante todo o dia, fez com que os primeiros minutos do jogo se resumissem a um escorrega-escorrega de jogadores das duas equipes. Até que, aos 9 minutos, Maurício marca gol contra e abre a vantagem pro Internacional.

Após o banho de água fria o Coxa diminui o ritmo, e o Inter parte pra cima. O torcedor Coxa-branca fica preocupado, o time não consegue fazer muitas jogadas, o perigo é iminente. Até o mascote parece preocupado. Dia de cão para o Coxa? Que nada! Aos 15 minutos do primeiro tempo Índio e Clemer, goleiro do Inter, fizeram uma lambança que deixou a partida empatada. Era o que o Coritiba precisava! Com o apoio da torcida o time cresceu e marcou mais três. Golaço de Keirrison, aos 7 do segundo tempo. Maurício marca aos 16 e Keirrison fecha para o Coxa, aos 22 minutos do segundo tempo.


Goleada? Nessa altura do jogo o mascote já dormia tranqüilo, o que de certa maneira refletia o espírito do torcedor, passado o sufoco inicial. Tranqüilidade um pouco abalada pelo gol do Inter, marcado por Nilmar, aos 24 do segundo tempo.

Depois disso não houve muitos lances de perigo. Com exceção da bela jogada de Keirrison, que quase marcou aos 41 minutos. Trabalho encerrado, ir pra casa e escrever a matéria.

Destaque para o cão mais vip das arquibancadas do Brasil. Não é qualquer cão que tem acesso às cadeiras e camarotes.

Agradecimentos: aos jornalistas e profissionais da comunicação com quem conversei, pela atenção; ao pessoal do suporte do CFC, pelas orientações, educação e simpatia com que me atenderam, e à assessoria de imprensa do Coxa, sem a qual não seria possível fazer esta reportagem.

Próxima cobertura: Vila Capanema. Fiquem atentos leitores do TiraGosto.

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NÃO DÁ MESMO PRA AGRADAR A TODOS

José Saramago tinha medo que seu livro caísse em mãos erradas, mas gostou da adaptação do “Ensaio Sobre a Cegueira” feita por Fernando Meirelles, o diretor de Cidade de Deus



pub. dia 03/10/2008 por Leandro Hammerschmidt

Agora quem não gostou nada do “Blindness” foi a Federação de Cegos dos EUA que pede boicote ao filme.

Sinceramente não era pra tanto, está certo que o filme é beeem forçado em algumas partes, por exemplo: 1) o machucado que necrosa a perna do cara 2) a cena que as mulheres marcham pro estupro e os maridos nada fazem. Poxa o cara do outro lado só tinha uma arma (um cego com revólver é pouco), não dá pra acreditar, nem mesmo em filme – está bem, pode me dizer que era uma metáfora. Aqui preciso confessar que não gosto muito das parábolas do Saramago, sei que ele é uma boa pessoa e até já troquei duas palavras com ele quando veio a Curitiba.

Mas para Marc Maurer, presidente da Federação Dos Cegos dos EUA “mostrar os cegos nas telas americanas um pouco melhor do que animais reforçará temores infundados e os estereótipos do grande público sobre a cegueira”. Saramago certamente não tinha esta intenção com o livro “Ensaio Sobre A Cegueira”. Creio que Fernando Meirelles também não tinha intenção de reforçar estereótipos negativos. Não mesmo, só pela cara de preocupação do Meirelles em agradar o Saramago já dá pra sentir o cuidado que ele teve pra fazer este filme. Sei lá se a Federação de Cegos Americana não esta pegando no pé ao sugerir o boicote. Se bem que polêmica pode trazer público. E lá dentro da sala de exibição é outra história, como disse Meirelles (no bate-papo do UOL) a pessoa que “vá pela sua cabeça, veja o filme e tire suas conclusões”.

No final esta polêmica vai trazer público, eu sou um: só escrevi por causa da confusão. E outra, não tenho certeza se teria tanta reclamação caso o filme fosse mais apelativo e descuidado (tipo um Resident Evil, com cegos-zumbis e tudo). Mas não é justo acusar o Meirelles, ele foi pelo caminho do Saramago. Tanto que a história é forçada em algumas partes – justamente por ser uma parábola.


O filme tem cenas emocionantes, trágicas e até engraçadas; os personagens têm defeitos e qualidades, no elenco gente nova e bonita + Juliane Moore e Glover. Sem falar nos efeitos de som, fotografia e até das legendas. Posso dizer que o filme tem alguma coisinha brasileira, mas não muito. Aliás, este filme até parece produção Hollywoodiana, mas na verdade é uma produção Brasil-Canadá-Japão; distribuído pala Miramax, rodado em Sampa, Canadá, Japão e no Uruguai se não me engano. Bem interessante envolver orientais: abre um mercado enorme, veja Lost e até o Manchester United conta com um Korean e Chinese em seu time.

Mas este coisa de juntar gente e grana de todo lado tem lado bom e lado ruim. Sei lá, parece bobeira, mas penso que se o diretor não tem personalidade forte ele perde o filme por causa da grana. Mas isto não depende da nacionalidade ou dos produtores. Depende da estima do cara. E Meirelles está bem!

Mas sinceramente gosto mais dos docs brasileiros que dos últimos filmes. Um legal foi o “dois filhos” co-produção da Globo filmes-Conspiração-ZCL-tristrar, mas coisa sertaneja no Brasil é sucesso garantido! Daniel Filho ficou cheião com as bilheteiras da Globo Filmes. E cinema é pra mala mesmo. Glauber Rocha foi respeitado dentro e fora do país levando a coisa (com ou sem lógica nas cenas e montagens) sem perder a liberdade. E a mala. Os caras de hoje se preocupam demais com o profissionalismo, com técnicas e parecem que tem medo de aparecer. Muita humildade faz mal pro artista, ninguém deveriam perder o orgulho, senão abre pra tudo. Imagino que numa produção a La Hollywood fica difícil ter liberdade (pra se enforcar até), visto que se alguém investe é pra ter retorno. Até dá pra conciliar. Chato é quando só a grana interessa, não tem vaidade, malice, onda, nem nada.

É difícil agradar a todos. Mas o momento é favorável (”ou o mundo se brasilifica”). A nossa universalidade é natural, é característica, mas acho que não precisamos perder a malice (a), a ironia, o brasileiro, os bandidos, aranhas e o histórico de chanchadas em nome de uma produção e distribuição da americana. Agora que chega mais uma vez “a nossa vez” (o que é Alice Braga?) devemos abusar! Veja comigo: se os europeus cansaram dos filmes de arte a ponto de dar o Urso de Ouro pro Tropa de Elite do José Padilha (que é um filmasso de ação pra passar na tela-quente, mas que não é nada de sociologia do crime como quiseram entender uns por aí) é porque alguma coisa mudou. O Urso veio porque os europeus não quiseram e não querem dar o braço a torcer pra Hollywood, mas também querem mudar; e por isso cabe premiar um filme de fora que tira ondinha com narrativa americana.


Liberdade pra inventar, criar e montar. A produção independente cresce. Os Docs do Brasil estão na ponta, tem uns até que sabem caçar prêmios. Mas quando se trata de cinemão fica difícil reinventar a roda, existe uma tradição de narrativa americana e vai bem. Só morreu a voz dos trailers estes dias. Mas o mundo inteiro usa aquela manha do Slash (de começar a música com um riff matador) e o não Blindness não seria diferente: começa a mil por hora, assim como o Tropa de Elite naquele tiroteio inicial. Ainda bem que em alguma parte o filme dos diretores brasileiros amolece e daí abre espaço pras sentimentalidades (nossa herança lusitana); o vilão e o mocinho se diluem. Aparecem mais as coisas humanas (em contraposição aos fetiches), os sentimentos, as contradições, coragens, fraquezas, a graça, a sexualidade e a malandragem do cego ladrão que apalpa os seios da Alice Braga na fila indiana.

Meirelles você é um bicão! Fique tranqüilo, você já agradou o Saramago, ganhou seu troco, fez um filme branco e legal. Nem esquente, pois os cegos americanos nem vão perder emprego nem nada. Pra falar a verdade acho que nem verão o filme (que piada infame). E se reclamaram, creio que foi motivado pelo título Blindness (Cegueira), que não é sutil como um Ensaio sobre a cegueira (puro conceitual ismo). Mas você também é publicitário e sabe o que faz. Deixa os caras reclamarem, como você disse “ou ama ou odeia o filme”. Continua nessa, com o Tropa deu certo.

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p.s. esta confusão me fez lembrar Turistas - um exploited passado no Brazil, onde turistas acabam assaltados, drogados e vítimas de uma quadrilha de órgãos, no melhor estilo lenda urbana. Mas quem viu Turistas? Quem deixou de visitar o Rio de Janeiro, tomar caipirinha e desfrutar das nossas delícias depois de assistir Turistas? Ninguém. Foi só fumaça.

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ENSAIO SOBRE A CEGUEIRA


pub. dia 25/09/2008 por Thalita Uba - uba_thali@yahoo.com.br


É com certo retardo que escrevo sobre o excelente Ensaio sobre a cegueira. Pensando bem, talvez tenha sido melhor esperar um pouco mais e levar em conta outros pontos de vista antes de me posicionar. Afinal, falar desse filme exige cuidado.

Digo isso porque a primeira coisa que preciso mencionar é a fotografia, que, aliada à direção de arte, constrói a alma do filme. Relembrando a opinião do colega cineasta que citei quando falei sobre A Festa da Menina Morta – que diz que “dizer que gostou da fotografia é a mesma coisa que dizer que o filme é ruim” –, devo admitir que, ao menos dessa vez, isso não é verdade. Fazer com que o espectador se sinta parte da trama, “cegando-o” por alguns breves momentos, foi uma sacada sensacional. Além disso, as locações conseguiram realmente reforçar a imagem de caos e destruição da história.


Não se pode deixar de mencionar a brilhante atuação de Julianne Moore, que, verdade seja dita, contou com a ajuda de todo o elenco, que desempenhou um trabalho primoroso (o que me faz sentir um certo “remorso alheio” por Sean Penn, que recusou o papel do médico). Outro fato interessante é que o filme é bastante fiel ao livro – coisa rara hoje em dia.

Há quem diga que o diretor abusou dos surrealismos. Aí me pergunto: “então por quê, meu caro, você foi assistir a um filme baseado em uma obra do Saramago?”. Não vejo, honestamente, outra forma de passar seus períodos longos e pontuação não convencional pra tela.


Fernando Meirelles vem, há anos, se firmando como exemplo de cinema de qualidade e, mais uma vez, acerta em cheio. Em Ensaio sobre a cegueira, ele prova a imensa capacidade que tem de fazer o público se envolver no enredo da história. Vale a pena conferir.

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